A ascensão do BRICS, Brasil, Rússia,
Índia, China e, mais recentemente da África do Sul, criou uma ordem mundial
muito mais complexa. Muitos aspectos levam a crer que a saúde financeira da
economia mundial depende do que acontece e do que acontecerá com esses países
num futuro próximo. Em contrapartida, a ascensão dos BRICS trouxe ventos fortes
de mudança para o cenário político e econômico mundial. Por essa razão, é
permitido indagar se a escolha do novo diretor geral da OMC apoiado pelos
BRICS, o brasileiro Roberto Azevedo, não seria o início desta mudança.
Em 2001, o economista Jim O’Neil, criou
o acrônimo “BRIC” ou “países BRIC ” para identificar quatro países em
desenvolvimento – Brasil, Rússia, Índia e China. Mais recentemente, este acrônimo
foi expandido, abrangendo também a África do Sul. O fato que o conceito BRICS
foi idealizado por um economista do mercado financeiro e não por um demógrafo,
como Alfred Sauvy que criou a noção de terceiro mundo num artigo para o jornal
francês L’Observateur em 1952, revela o quanto que a globalização econômica está
moldando os novos atores geopolíticos. A escolha recente do novo diretor da OMC
pode ser o primeiro sinal da real importância da união de forças entre os
BRICS, para fazerem valer uma política de comércio global diversa daquela
desejada pelos países desenvolvidos. É fato que o candidato escolhido tinha o
apoio explícito do BRICS, em contraposição ao outro candidato, o mexicano Herminio
Blanco, sustentado pelos países desenvolvidos, os Estados Unidos e a União
Européia.
Do ponto de vista econômico, os BRICS
são uma realidade, apesar dos tempos difíceis da economia mundial pós-2008. Além
da importância econômica desses países, fica claro que os BRICS estão buscando,
cada dia mais, unir forças diplomáticas para interferir nos rumos do cenário político
mundial. Numa perspectiva histórica, a primeira vez que quatro dos países BRICS
juntaram suas forças, eles comprometeram os resultados da Rodada de Cancun da
OMC – a Rússia não era integrante da OMC na época e não participou das
negociações. Ao invés do esperado resultado ganha-perde para o comércio
mundial, com a balança pendendo para o mundo desenvolvido, esta união de forças
dos BRICS trouxe um resultado perde-perde para todas as partes envolvidas.
Todos os atores envolvidos sofreram, ao invés de apenas os países do terceiro
mundo sofrerem as conseqüências da liberalização comercial. Não se pode negar
que quatro dos BRICS – Brasil, Índia, China e África do Sul – influenciaram,
uma vez mais, os resultados das negociações da Rodada Doha. Não se pode,
também, esquecer a importante tarefa realizada pelos BRICS na construção do
G-20. Nem podemos fechar os olhos para os esforços do Brasil e da Índia para
alcançar uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, ao lado da
Rússia e da China. Por fim, o novo status da Rússia, como membro da OMC após
quase duas décadas de negociações, já trouxe com a eleição do novo diretor
geral da OMC e trará ainda mais força à aliança BRICS, e não só para as
negociações comerciais multilaterais como para o cenário político global.
O movimento da balança comercial mundial
está mudando e, talvez, de modo irreversível, pelo novo mundo emergente. Não mais
se vê o domínio dos países desenvolvidos sobre o terceiro mundo na liderança
das discussões comerciais. Isto porque, para usar os dizeres que se tornaram
clássicos de Alfred Sauvy, este terceiro mundo tão ignorado e explorado, quer
também se tornar alguma coisa. As negociações comerciais globais não são mais como
no século passado. O início das negociações para criação de uma zona de livre
comércio entre os Estados Unidos e a União Européia demonstra que o mundo
desenvolvido já está sentido a força da união dos BRICS e busca, assim, fortalecer
a aliança clássica, para fazer frente a esta nova força política no cenário comercial
global. Gostem ou não, os BRICS fazem parte do novo cenário geopolítico mundial.
Os BRICS devem, portanto, ser levados a sério, pois a posição política que
ocupam no atual sistema global só tende a aumentar nos próximos anos e nas
próximas décadas. A eleição do candidato a Diretor Geral da OMC, apoiado pelos
BRICS, reflete o que está acontecendo na balança do comércio internacional nos
dias de hoje e no cenário político global como um todo.
Ligia Maura Costa. Advogada,
Sócia Ligia Maura
Costa, Advocacia. Professora titular da FGV-EAESP. Autora do livro: BRIC. Doing Business in BRIC
Countries. Legal Aspects. (2012). v. 1, São Paulo: Quartier
Latin.